Mecânica do passado: Dicas para manutenção de veículos clássicos. Fabricantes de autopeças revelam os segredos de como cuidar dos carros com mais idade, quando fazer as revisões periódicas, já que rodam menos, e como verificar o desgaste real dos componentes
Texto: Carol Vilanova
Fotos: Divulgação
Ser proprietário de um veículo antigo se tornou nos últimos anos uma modalidade apaixonante dentro do universo automotivo. E cuidar dessas verdadeiras preciosidades é essencial para mantê-los em bom funcionamento, independente da idade do carro. Mesmo porque, carros clássicos podem ser mais caros do que um zero km, dependendo das suas condições.
Quem tem um carro clássico se orgulha dele e com certeza não vai levá-lo para qualquer mecânico para fazer as manutenções. Por isso, conversamos com algumas grandes fabricantes de autopeças que revelaram dicas valiosas para reparo e preservação desses verdadeiros tesouros sobre quatro rodas.
Em geral, é indispensável fazer as revisões periódicas para inspeção dos sistemas e suas peças, além disso, o motorista tem que estar sempre de ouvido atento para determinar se existem ruídos anormais. Sistemas como motor e arrefecimento tendem a ser mais problemáticos, por isso, uma atenção especial aos seus componentes é recomendada.
Carburador, filtros, freios, amortecedores e pneus sofrem desgastes que devem ser observados no tempo certo, mesmo quando ficam parados por muito tempo. O combustível é mais um item a se ter cautela e deve ser escolhido corretamente, pois ficam mais tempo no tanque. Por isso, indique a seu cliente que abasteça com combustível de boa procedência e tente manter o tanque cheio, para evitar espaço para condensação de água.
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“O veículo clássico tende a rodar menos que o veículo de uso diário, por isso as revisões devem ser feitas de acordo com essa condição, normalmente sendo regrada por tempo e não quilometragem”, explica Rafael Recio, gerente de Produto e Suporte Técnico da Motul Brasil. Ele afirma que mesmo estando parado, os fluidos devem ser trocados, obedecendo rigorosamente um plano de manutenção, independentemente do carro ter ou não atingido uma quilometragem limite desse plano.
“Em muitos casos é conveniente deixar o motor funcionando por um tempo para garantir que a viscosidade dos fluidos seja ideal para que cumpram sua função. É uma forma de evitar danos e aproveitar o momento para ficar atento a qualquer anormalidade de funcionamento antes de sair rodando”, orienta.
Revisão em ordem
De acordo com a engenharia da Magneti Marelli Cofap, é essencial fazer a inspeção periódica dos amortecedores, assim como dos demais componentes da suspensão, sempre que o veículo passar por uma revisão ou surgirem ruídos provenientes do sistema.
“Fique atento aos sinais mais evidentes de que o amortecedor está comprometido, verifique as condições do amortecedor a cada revisão e sempre que o motorista sentir insegurança ou dificuldade em controlar o carro em curvas e freadas. Pneus quicando descontroladamente ao passar por buracos ou o desgaste prematuro dos pneus também podem indicar perda de eficiência. Ruídos na suspensão podem ser gerados por diferentes componentes e só uma verificação realizada por mecânico especializado poderá identificar a peça danificada ou simplesmente a necessidade de reaperto da suspensão”, explica Mônica Cassaro, Diretora de Marketing, Comunicação, Engenharia e Assistência Técnica Marelli Cofap Aftermarket.
A marca afirma que em caso de necessidade, o ideal é sempre trocar os amortecedores em pares no mesmo eixo, já que a substituição do amortecedor de somente um dos lados pode causar o desequilíbrio entre as rodas do mesmo eixo, prejudicando seriamente a dirigibilidade.
“Além disso, examine todo o sistema de suspensão, como molas, barras estabilizadoras, bandejas de suspensão e bieletas. Todos esses itens são fundamentais para que o veículo trafegue de maneira segura, com estabilidade direcional nas retas e durante curvas e frenagens. E lembre-se de nunca usar amortecedores recondicionados, já que as peças fundamentais para segurança e têm participação ativa na estabilidade e dirigibilidade de um veículo”, esclarece.
Por estar muito envolvida no segmento de veículos antigos, a Delphi Technologies indica, primeiramente, esquentar o motor antes de dirigir para melhorar o desempenho do motor. No caso de carburador, faça uma revisão a cada 90 dias. Utilize o óleo recomendado e funcione o motor pelo menos uns 20 minutos por semana em sua temperatura de trabalho.
Em relação aos freios, a Delphi alerta: já que são mais antigos, a lona de freio pode sofrer desgastes e é de fundamental importância trocar no momento certo. Segundo a marca, como estes veículos ficam parados por muito tempo, é importante calibrar os pneus periodicamente para não ocorrer deformações nos compostos.
A empresa orienta ainda ficar de olho na bateria, por ficarem um bom tempo sem rodar alguns componentes podem consumir a carga da bateria, como alarmes, por exemplo, por isso, o cuidado com este item deve ser redobrado.
Juliano Caretta, Training Supervisor Aftermarket Ride Performance da DRiV, fabricante de produtos das marcas Monroe e a Monroe Axios, fala ainda sobre a limpeza do clássico, mantendo-o livre de sujeiras e intempéries que danificam a pintura e o cromado das partes metálicas.
“A lavagem deve ser feita sempre com produtos neutros, e com baixa pressão de água para não deslocar ou danificar peças menores. A limpeza também é importante na parte interna do veículo, com a higienização dos tecidos dos bancos, painéis e revestimentos em geral. Se o carro tiver alguma composição em couro, é essencial a hidratação evitando assim manchas e rachaduras”.
Ele explica ainda que procedimentos como o polimento e enceramento garantem uma película de proteção e brilho extra à pintura do veículo, dando aquele aspecto de carro novo. Sempre guarde o carro em local protegido de sol e chuva e de baixa umidade, o uso de uma capa forrada ajuda a prolongar esses efeitos na lataria.
“Os combustíveis parados por muito tempo no tanque podem trazer sérios problemas para o motor e carburador do clássico. Para evitar isso, escolha sempre um combustível premium no momento de abastecer e renove-o frequentemente para que ele não fique armazenado por muito tempo”, complementa.
O executivo técnico da Marca Mobil, Sidnei Bincoletto, fala quais são os principais cuidados com a lubrificação do motor. “Utilizar o produto correto, de boa qualidade, que atenda as especificações indicadas pelo fabricante, como viscosidade, classificação API, ACEA e aprovações das montadoras é essencial”.
Além disso, respeitar a quilometragem ou o tempo de troca, o que ocorrer primeiro, mas informação está descrita no manual do proprietário. “Manter o nível ideal do óleo do motor. Para isso é necessário verificar o nível do óleo com a periodicidade e seguindo as instruções do manual do fabricante”, diz.
Sidnei garante que não é recomendável misturar óleos com tecnologias diferentes (mineral, semissintético e sintético). “Além disso, não se deve utilizar aditivos complementares, visto que o óleo já possui todo o pacote de aditivo necessário para o uso”, conclui.
Outro especialista em lubrificantes, Rafael Recio, gerente de Produto e Suporte Técnico da Motul Brasil, conta que existem mitos e informações desencontradas sobre qual seria a melhor forma de conservação dos veículos clássicos. Muito disso ocorre, pois existem variáveis que podem interferir, como o clima da região ou o tipo de veículo.
“Mesmo ficando parado ou sem uso por boa parte do tempo, o veículo clássico precisa ter seus fluidos trocados, principalmente, prévia a uma parada por um longo período. A troca provavelmente ocorra por tempo, não por quilometragem, mesmo assim os fluidos devem ser trocados, pois se contaminam com fuligem da combustão, combustível não queimado e umidade do ar, entre outros. Essa contaminação acelera a degradação do fluido. Por isso, mesmo com pouco uso, o óleo pode estragar e, consequentemente, não cumprir sua função”, comenta.
No caso dos veículos clássicos, existe um fator complicador, pois em muitos casos a especificação se tornou obsoleta e não existe mais, tornando a disponibilidade do produto mais difícil, segundo Rafael. “Nem sempre usar uma especificação mais moderna pode ser um upgrade na qualidade, principalmente, em carros clássicos, por isso a nossa recomendação é seguir a tecnologia e a especificação que eram usadas na época”, diz.
Ele diz que em caso dos lubrificantes, por exemplo, até existe uma classificação especial para normas obsoletas (que não poderiam ser comercializadas por serem muito antigas), mas que é liberada mediante a comprovação de que o produto foi desenvolvido para uso em carros clássicos. Algo semelhante a uma “placa preta”.
Jair Silva, gerente de Qualidade e Serviços da Nakata, explica que o mecânico deve ficar atento aos ruídos no sistema de suspensão. “Para os veículos mais antigos essa inspeção deve ser estendida para todos os componentes do sistema, uma vez que o desgaste do amortecedor pode indicar problemas e outros componentes do sistema, como, pivôs, bandejas, molas, coxim, coifa, terminais entre outros. Já as peças dos veículos clássicos e de colecionadores tendem a apresentar baixo desgaste uma vez que o deslocamento, quando ocorre é de pequenos trajetos”.
Ele diz que o desgaste depende do modo que o motorista dirige. Terrenos irregulares e esburacados podem encurtar a vida útil dos amortecedores. “As más condições da pavimentação exercem mais impacto nos amortecedores e podem provocar o desgaste de seus componentes. É importante lembrar que o motorista acaba se adaptando às mudanças geradas pelo desgaste das peças ao trafegar com o carro. Isso porque as alterações acontecem paulatinamente e o motorista se acostuma e acaba achando que é a condição normal do veículo”, comenta.
A recomendação na hora da troca é usar o modelo de amortecedor indicado pela montadora do veículo. “A maioria dos veículos mais antigos utiliza amortecedores convencionais, poucos modelos como Santana, Corsa e Gol possuem também a possibilidade de usar amortecedores pressurizados, pois existem versões equipadas de fábrica com convencionais e pressurizados”, complementa.
Hiromori Mori, consultor de Assistência Técnica da NGK, observa que veículos antigos normalmente são carburados e que trabalham com uma mistura ar/combustível mais rica, havendo maior tendência de carbonizar as velas. “Nestes casos, a troca das velas é realizada em intervalos menores que os veículos novos. Velas carbonizadas dificultam a partida, aumentam o consumo de combustível e provocam falhas de funcionamento”, coloca.
Ele continua: “Não é recomendável a limpeza das velas – a prática de limpar velas na escova de aço provoca desgaste e arredondamento dos eletrodos de forma prematura. Além disso, remove o banho de proteção da rosca da vela, promovendo a oxidação de parte da rosca. Ligar o veículo regularmente e andar com ele, imprimindo rotações constantes, próximas a rotação de torque e potência máxima por um período de 15 a 20 minutos, favorece a autolimpeza da vela e da câmara de combustão.
Segundo ele, veículos antigos possuem maior número de componentes no sistema de ignição, como distribuidor, platinado, condensador, tampa, rotor, cabos e bobinas, além das velas. “Os componentes do distribuidor possuem regulagens específicas e maior tendência ao desgaste por ter muitas peças móveis. Regulagens inadequadas ou desgastes interferem diretamente no desempenho das velas de ignição, portanto é recomendável uma inspeção do sistema de ignição”, diz.
Por ficarem muito tempo parados, o combustível tende a ficar velho e perder suas características e dificultam a sua queima. “Além de promover a formação de resíduos de combustível no carburador, a dificuldade de queima causa o encharcamento da vela, que fica molhada com resíduo de combustível e perde a sua isolação elétrica, provocando falhas, dificuldade de partida e aumento de consumo. Em alguns casos, fazer a remoção da vela e esperar para secar a vela e a câmara de combustão ajudam. Se o resíduo for oleoso ou não evaporar, é necessária à sua substituição”, completa o consultor.
“Os filtros automotivos são itens que garantem a segurança e que devem ser trocados sempre de acordo com o manual do veículo”, alerta Plinio Fazol, gerente de Marketing e de Novos Produtos da Tecfil. Ele explica que os filtros funcionam como uma barreira contra as impurezas e podem influenciar diretamente no funcionamento do veículo, evitando diversos problemas mecânicos.
Avaliar o sistema de lubrificação é fundamental numa revisão, pois ele é o responsável pela proteção contra o desgaste e a quebra de peças. Os filtros de óleo agem eliminando as impurezas resultantes da fricção das peças móveis do motor e da combustão. A Tecfil recomenda que a troca deste filtro seja feita sempre junto com a troca do óleo do motor.
Nos filtros de combustível, o prazo para a troca deve seguir conforme as recomendações do fabricante do veículo, assim como o filtro de ar do motor, que empede a entrada e a circulação de poeira abrasiva no seu interior, que pode provocar o mau desempenho do motor e o aumento do consumo de combustível. “Quando este filtro está sujo, a recomendação é que ele seja trocado imediatamente e nunca o limpar com jatos de ar comprimido”, diz.
Carol Vilanova, editora da Revista e Portal Oficina News, é jornalista (Mtb 26.048) e trabalha desde de 1996 na imprensa editorial automotiva. Em 2003 iniciou sua participação no mercado da reparação e reposição automotiva, inclusive como editora da Revista o Mecânico por 12 anos. No ano de 2014, idealizou o Portal Oficina News, que em 2016 teve sua versão impressa publicada, a Revista Oficina News, sob a chancela da Editora Ita & Caiana. Sob sua responsabilidade editorial, publica também a Revista Frete Urbano.